Os animais

Por Rosana Souza-Lima

A Terra tem cerca de 4,5 bilhões de anos, e os primeiros fósseis possuem cerca de 3,5 bilhões de anos. Imagina-se que aos poucos foi se acirrando a competição pelas moléculas orgânicas disponíveis para nutrição, e há cerca de 3,4 bilhões de anos surgiram pequenos organismos unicelulares que conseguiam usar substâncias inorgânicas simples para produzir a energia necessária às suas atividades. Esse foi o caminho que permitiu que prosseguisse a vida na Terra – a quebra da molécula de H2O, que era abundante na terra, liberando O2 que passou a ser utilizado pela maioria dos organismos autotróficos.

Em 1990, o microbiologista Carl Woese (1928-2012) propôs o agrupamento dos seres vivos em três domínios: dois constituídos por procariontes (Bacteria e Archaea), e um terceiro reunindo todos os seres eucariontes, Eukarya (Figura 1). Uma das mais corroboradas propostas de divisão do Domínio Eukarya é a que une no grupo Opisthokonta os dois mais conhecidos grupos de Eukarya heterótrofos: os fungos e os animais. Opisthokonta é definido pelo fato da maioria das células de seus membros apresentar cristas mitocondriais planas, e as células flageladas normalmente terem um único flagelo originando-se na extremidade posterior da célula (Figura 2).

Diagrama da árvore da vida numa perspectiva filogenética molecular.
Figura 1: Principais grupos de seres vivos numa perspectiva filogenética molecular (adaptado de Nealson, 1997).
Figura 2: Divisão do Domínio Eukarya em grupos; os retângulos vermelhos mostram a posição dos dois grupos de heterótrofos mais conhecidos, os animais e os fungos. Fonte: Adaptado de Alastair Simpson, Dalhousie University, 2020; CC-BY-SA-4.0 (https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Eukaryote_Phylogeny.png).

Há evidências de que a vida procarionte (que são as células com material genético solto no citoplasma) tenha surgido nos oceanos primitivos e há cerca de 2 bilhões de anos, uma dessas células tornou-se endossimbionte (= passou a viver dentro) de outra: isso teria originado as mitocôndrias, resultando numa célula eucariótica que tinha a possibilidade de lidar com a oferta de oxigênio, que estava começando a aparecer na atmosfera da Terra. A célula eucariótica é a que tem o material genético guardado dentro de uma bolsinha membranosa, o núcleo. Milhares de anos se passaram desde a origem desses primeiros organismos eucariontes até eles de fato se diversificarem, mas talvez essa lacuna tenha sido criada por esses organismos terem corpo pequeno e sem esqueletos duros, dificultando que deixassem registro fóssil. Aparentemente ainda não havia oxigênio suficiente para permitir a evolução de formas maiores de microrganismos e, na verdade, nem todo organismo se torna um fóssil, ao morrer: são necessárias condições especiais para que isso aconteça (falamos sobre isso em “O que são fósseis, como se formam e sua importância”).

Atualmente estima-se que os primeiros animais teriam menos de 900 Ma (Ma = milhões de anos). Vários desses registros são icnofósseis, vestígios deixados nas rochas pelas atividades realizadas por esses organismos. Embora haja vestígios até mesmo de formas embrionárias, ainda há muita discussão sobre a idade dos primeiros bilatérios, que parece girar em torno de 565 milhões de anos, na era Neoproterozóica (Pré-Cambriano). Aparentemente o grupo-irmão dos animais são “protistas” coanoflagelados, organismos geralmente coloniais, formados por uma única célula e com um único flagelo, circundado por um colar transparente contendo filamentos de actina. A proposta é de que uma linhagem colonial tenha diferenciado células corporais e reprodutivas, levando ao surgimento de organismos multicelulares cujas células são mantidas juntas por estruturas adesivas: os animais! Outras linhagens de “protistas” foram as ancestrais de Fungos e Plantas, grandes grupos de organismos pluricelulares.

Intervalo para uma reflexão: por que estou escrevendo “protista” entre aspas? Esse grupo de seres eucariontes unicelulares eram considerados um Reino. Entretanto, hoje se sabe que os “protistas” não formam uma linhagem única, e podemos ver isso na Figura 2: se excluirmos plantas, animais e fungos, todos os outros nomes se referem a organismos que anteriormente eram incluídos nesse “Reino Protista”. Assim, continuamos usando esse termo por conveniência, mas não se refere a um agrupamento monofilético de organismos. Monofilético são os grupos que têm uma história evolutiva comum pois descendem do mesmo ancestral.

Os Metazoa são um grupo monofilético definido por muitas novidades evolutivas (= sinapomorfias; leia o texto “Como identificar relações de parentesco entre os seres vivos?”). Além da multicelularidade e da presença de junções epidérmicas aderentes, todos apresentam um estágio embrionário com blástula e todos, exceto os Porifera (popularmente chamados de “esponjas”), apresentam o estágio de gastrulação (Figura 3), que gera duas camadas embrionárias: epiderme externa e endoderme interna; a presença de diferentes camadas embrionárias leva à produção de estruturas distintas, aumentando a diversidade de formas dentro do grupo. Os animais possuem, ainda, processos únicos na produção de ovócitos (gametas femininos) e de espermatozóides (gametas masculinos), células com metade da carga genética do indivíduo adulto (= haplóides, símbolo “n”) que, quando se unem durante o processo de fecundação, resultam em um organismo com dois conjuntos de material genético, um vindo do ovócito da mãe e outro do espermatozóide do pai (= diplóide, símbolo “2n”). Apresentam, ainda, estruturas relacionadas à sustentação e movimentação corporal, como as proteínas contráteis actina-miosina e a proteína colágeno.

Figura 3: Representação das fases embrionárias de blástula e gástrula em Metazoa (adaptado de Lopes, 2008).

Ao final da era Proterozoica, há cerca de 750 milhões de anos, começou a quebra do supercontinente Rodínia. Nessa era ainda havia pouco oxigênio na atmosfera e nas regiões mais profundas do oceano. Há indícios da ocorrência de três períodos de glaciações, cada um durando cerca de 10 milhões de anos, separados por períodos de aquecimento forte e rápido, provavelmente produzido por fortes erupções vulcânicas que provocavam o acúmulo de CO2, resultando em um efeito estufa; nesse contexto surgiram os metazoários. Posteriormente, quando o nível de oxigênio na atmosfera aumentou e se estabilizou, teria permitido a rápida diversificação de organismos grandes e mais ativos.

No cladograma resumido dos Metazoa (Figura 4) estão os nomes dos maiores filos animais, para que você tenha um panorama geral do Reino. Para cada ponto da história evolutiva desses organismos será citada, nesse texto, ao menos uma novidade evolutiva que a partir dali levou à grande diversificação das linhagens descendentes.

Resumo das relações filogenéticas entre os principais grupos de Metazoa.
Figura 4: Resumo das relações filogenéticas entre os principais grupos de Metazoa; algumas características que definem cada um dos grupos são citadas no texto. Fonte: Rosana Souza Lima, 2021 (CC BY-NC 4.0).

Embora seja difícil perceber o porquê dos exemplares incluídos no Filo Porifera serem considerados animais, eles compartilham conosco as características que definem Metazoa. Entretanto, não formam tecidos verdadeiros. Alimentam-se de partículas em suspensão capturadas pelos coanócitos, células flageladas muito semelhantes aos organismos coanoflagelados. A água entra em seus corpos por vários pequenos poros e sai por uma abertura maior, o ósculo; a parede corporal pode ser bastante elaborada, aumentando a área superficial em contato com a água, a quantidade de células corporais e potencializando a filtração e captura de partículas (Figura 5). A maior parte das espécies atuais é de água salgada, mas algumas espécies ocorrem em água doce. Muitos membros desse grupo apresentam esqueletos internos formados por espículas calcárias e silicosas, o que garante melhores condições de fossilização.

Figura 5: A) Diferentes tipos de complexidade morfológica em Porifera; as setas azuis mostram o fluxo da água na cavidade corporal, que não funciona como uma cavidade digestiva. Fonte: adaptado por Philcha, https://commons.wikimedia.org/, (CC BY-SA 3.0), de Ruppert & Barnes, 2004. B) Colônia com muitos organismos de esponjas da espécie Hymeniacidon sanguinea (Família Hymeniacidonidae): os poros maiores são os ósculos, por onde sai a água que circula por seus corpos; Cabo Frio, RJ. Fonte: Rosana Souza-Lima, 2013 (Copyright).

O filo Cnidaria se caracteriza por ser diblástico: como seu embrião sofre gastrulação, desenvolverá dois tecidos embrionários (Figura 6): a ectoderme externa e a endoderme interna. Muito diverso, inclui formas muito conhecidas, como medusas, anêmonas-do-mar e corais; esses últimos, que formam extensas colônias interligadas por seus esqueletos de carbonato de cálcio formam os mais importantes registros fósseis desse filo. Nesse grupo, radialmente simétricos, ocorre um sistema digestório incompleto, onde a ingestão de alimento e a eliminação de resíduos não digeridos (= fezes) ocorrem pela boca.

O peixe Amphiprion sp. vive em simbiose entre os tentáculos da anêmona-do-mar, que é um Cnidário.
Figura 6: O peixe Amphiprion sp. vive em simbiose entre os tentáculos da anêmona-do-mar, que é um Cnidário; Aquário de Quebec, QC, Canadá. Fonte: Ricardo Souza-Lima, 2013 (Copyright).

Os grupos seguintes são bilateralmente simétricos e triploblásticos: durante a neurulação, fase que sucede à gastrulação, a camada embrionária interna, endoderme, diferenciará um terceiro folheto germinativo, a mesoderme. Esse folheto embrionário é responsável pela origem de muitos tecidos e estruturas, como musculatura, tecidos conjuntivos, estruturas esqueléticas e sistemas circulatório, excretor e reprodutor. Em alguns grupos o peritônio, tecido mesodérmico, margeia uma cavidade corporal, o celoma; o sanduíche formado pela bolsa de peritônio com celoma interno, preenchido por líquido celomático, fica em volta dos órgãos corporais. Notamos, portanto, como o surgimento da mesoderme é fundamental para a origem da crescente complexidade corporal que observamos nos animais.

O filo Platyhelminthes inclui vermes achatados dorsoventralmente e acelomados, pois neles a mesoderme não forma cavidade celomática. Há espécies de vida livre em água doce ou salgada, mas a maioria delas é de parasitas; tubo digestório incompleto e até mesmo ausente em algumas formas. Seus corpos moles não formam registros fósseis importantes.

Os moluscos são caracterizados por possuírem corpo com cabeça, pé e massa visceral, essa última coberta por um tecido chamado “manto” que geralmente secreta o esqueleto em forma de concha, composto por carbonato de cálcio (Figura 7). Alguns grupos não têm concha, porém, ou têm concha reduzida e interna. Entretanto, graças à essa estrutura, formam um rico e informativo registro fóssil. Os Anelídeos, grupo proximamente relacionado, têm corpo fortemente segmentado, muitas formas com o corpo repetindo várias vezes segmentos muito parecidos entre si, geralmente com cerdas, e sistema nervoso ganglionar bem desenvolvido. Animais com essas características são conhecidos aproximadamente a partir do Cambriano.

Figura 7: Exemplar da Família Nautilidae que abriga as últimas formas viventes de moluscos cefalópodes. Nautilus pompilus Linné, 1758, Indo-Pacífico – Museo Bernardino Rivadavia, Buenos Aires. Fonte: Rosana Souza Lima, 2007 (Copyright).

Nas rochas do período Ediacarano (final da era Proterozoica) nos deparamos com uma grande surpresa: há registros de invertebrados marinhos que incluem formas muito parecidas à de filos que ainda ocorrem hoje em dia, como os Porifera (esponjas), Cnidaria (corais e águas-vivas), Mollusca (caramujos e polvos). Alguns dos mais de 100 gêneros de fósseis ediacaranos descritos tanto de águas rasas quanto profundas, porém, são diferentes de tudo o que conhecemos. Aparentemente a maioria deles possuía corpos moles, sem partes duras de grandes tamanhos. Já se encontra registros de duas formas corporais: os que apresentavam simetria radial, como os Cnidaria e equinodermas atuais, e os com simetria corporal bilateral. Muitos desses organismos entraram em extinção na transição do para o Cambriano, no último evento de glaciação do Proterozoico.

Figura 8: Simulação de representantes da fauna de Burgess Shale, oeste do Canadá (Cambriano Médio; Royal Tirrel Museum, Drumheller, AB, Canadá). Fonte: Rosana Souza-Lima, 2017 (Copyright).

O éon Fanerozoico, que inclui as eras Paleozoica, Mesozoica e Cenozoica – essa última sendo a nossa era atual – é palco de um período de ocorrência de muitas formas de vida. Começou, na era Paleozoica (541 a 252 Ma), com a “explosão do Cambriano” (Figura 8), período entre 541 e 485 Ma no qual os animais continuaram a enfrentar oscilações climáticas extremas e mudanças químicas da atmosfera e dos oceanos. O aumento no teor de cálcio dos mares influenciou o surgimento de muitos organismos com esqueletos bem-mineralizados inclusive representantes da maior parte dos filos animais que conhecemos atualmente. Talvez a “popularização” desses esqueletos seja um indício de que nesse período aumentaram as atividades predatórias nos mares. Enquanto a fauna ediacarana inclui maior número de espécies que se alimentavam de detritos e material em suspensão, no começo do Cambriano há registros de carnívoros e herbívoros, como artrópodes predadores gigantes, e no final do Cambriano já ocorrem registros de peixes agnatos, talvez hematófagos (comedores de sangue) ou saprófagos (comedores de animais mortos) como os que existem atualmente. Assim, ampliaram-se muito os nichos ecológicos nos ambientes marinhos, e muitas dessas linhagens cambrianas viveram por muitos milhões de anos.

Figura 9: Modelos didáticos para exibir os grupos agnatos viventes atualmente: A) Exemplar de Petromyzontiformes (lampréia); B) Petromyzontiformes: larva amocetes à esquerda e corte longitudinal de cabeça de lampréia adulta à direita; C) Myxini (feiticeiras): corpo inteiro, comportamento de nó e detalhe da cabeça. Fonte: Rosana Souza-Lima, 2021 (Copyright).

Trabalhos publicados recentemente sugerem que alguns desses filos tenham, na verdade, se originado no período Ediacarano. Algumas das discussões avaliam a taxa de oxigênio livre nesses períodos, que certamente está ligada à evolução da vida animal. Provavelmente foram necessários alguns milhões de anos para acúmulo do oxigênio livre produzido pela fotossíntese das cianobactérias. É possível, também, que os oceanos proterozoicos tenham sido mais oxigenados nas regiões mais superficiais e mais anóxicos nas regiões mais profundas. O oxigênio permitiu a evolução de formas maiores e de formas mais ágeis, que podiam sair em busca de suas presas, gastando muita energia nesse processo.

Nematoda e Artropoda formam, com outros filos menores, o clado Ecdysozoa, pois trocam a cutícula quitinosa ao menos uma vez durante seu ciclo de vida. Nematoda geralmente têm uma troca entre cada um dos 4 estágios de crescimento. Apresentam um par de órgãos sensoriais cefálicos, os anfídios, que consistem em um poro externo ligado por um ducto a uma bolsa anfidial ligada ao anel nervoso cerebral; provavelmente são quimiorreceptores. Os Artrópodos são, de longe, o maior grupo de animais com espécies descritas, e com seu exoesqueleto quitinoso estão presentes em registros fósseis desde o pré-Cambriano. Ainda assim, estima-se que o que conhecemos é cerca de 10 a 20 % de todas as formas que existem.

Figura 10: Exemplo da diversidade de insetos (Arthropoda), o maior grupo de seres vivos atuais; Insetário, Jardim Botânico, Montréal, QC, Canadá. Fonte: Rosana Souza-Lima, 2013 ( Copyright ).

O modo de formação da boca, ânus e celoma é um dos critérios que agrupa os animais dos filos Hemichordata, Echinodermata e Chordata como deuterostomados. Há uma proposta de que os dois primeiros filos sejam mais próximos entre si por compartilharem o mesmo destino do blastóporo, que geralmente forma ânus (embora alguns grupos tenham sofrido regressão e apresentem tubo digestório incompleto) e por exibirem uma larva com estrutura bem parecida. Ambos os grupos só têm representantes marinhos. Os Hemichordata são vermes de corpo mole dividido em probóscide ou escudo, colarinho e tronco. Apresentam uma estomocorda que já foi considerada homóloga da notocorda, embora a opinião atual é de que não seja; daí o seu nome. Já os Equinodermas, com simetria bilateral nas larvas e simetria radial desenvolvida secundariamente no adulto, têm um complexo sistema de canais que forma um sistema ambulacral que, além de auxiliar na locomoção, serve também para respiração, excreção e captura de alimento, a depender do organismo. Equinodermos também apresentam um rico registro fóssil, já que a maioria das formas apresenta um endoesqueleto de carbonato de cálcio.

Figura 11: Exemplos de Equinodermos: A) Ouriço-do-mar, Lytechinus variegatus; B) Pepino-do-mar, Holothuria grisea; Cabo Frio, RJ. Fonte: Rosana Souza-Lima, 2018 ( Copyright ).

Os Chordata são um grupo mais conhecido por incluírem os Vertebrata. Atualmente passa por muitas modificações de nomenclatura resultantes da metodologia cladista. O grupo “Pisces”, por exemplo, não é monofilético e, na verdade, engloba quatro grupos principais: Myxini (feiticeiras), Petromyzontiformes (lampréias), Chondrchthyes (‘peixes’ secundariamente cartilaginosos) e Osteichthyes, os peixes ósseos. Esse último inclui dois grupos principais: os Actinopterygii, que inclui cerca de 30 mil espécies de ‘peixes’ nos quais a nadadeira só apresenta raios, sem musculatura, e Sarcopterygii, com 8 espécies de ‘peixes’ ainda existentes e os Tetrapoda. Os Tetrapoda incluem os Anfíbios e os Reptilomorpha. Nesse último grupo estão incluídos os répteis, aves e mamíferos. Prestou atenção no que está escrito aqui? Nós, mamíferos, somos um tipo de Osteichthyes, portanto…

Figura 12: Osteichthyes: A) Lepidosiren paradoxa (única espécie de Sarcopterygii existente atualmente na América do Sul; loja de aquário); B) Geophagus brasiliensis (Actinopterygii; rio Grande, Jaconé, Saquarema, RJ). Fonte: Rosana Souza-Lima, 2018 ( Copyright ).

Os primeiros peixes teleósteos (grupo de Actinopterygii onde são incluídas a maioria das espécies que ocorrem no planeta atualmente) e os famosos euriptéridos (conhecidos como “escorpiões-marinhos”, embora não sejam escorpiões), proliferaram no período Ordoviciano. Os primeiros artrópodos terrestres surgiram no Siluriano e no Devoniano o número de formas de vida terrestres aumentou muito, graças à diminuição do CO2 atmosférico (veja no texto sobre “Os vegetais”). Cerca de 80% das espécies conhecidas pelos cientistas atualmente são artrópodes, e os insetos são cerca de 80% desse total.

No Permiano há cerca de 270 Ma, houve a maior extinção em massa do Planeta, na qual cerca de 90% das espécies marinhas e 70% das terrestres foram eliminados, incluindo formas comuns até então, como alguns tipos de corais e os trilobitas.

No Triássico (já na era Mesozoica, há cerca de 200 Ma) houve a formação da Pangeia. O clima do planeta era quente, e haviam grandes desertos. Após a extinção de Permiano a diversidade de animais ampliou-se rapidamente, e surgiram os dinossauros e os primeiros mamíferos terrestres. Ao menos na parte mais rasa dos mares sabemos que aumentou a diversidade de corais e peixes. Houve, porém, um novo evento de extinção em massa, que resultou no desaparecimento de aproximadamente metade das espécies da época.

Figura 13: As montanhas Atlas, no Marrocos, são parte da formação Província Magmática do Atlântico Central, que ocorreu em parte da região mediana da Pangea no Mesozoico, há cerca de 200 Ma. Entre as montanhas, o rio Ziz (Oued Ziz; Errachidia, Marrocos). Fonte: Ricardo Souza-Lima, 2010 ( Copyright ).

O período Jurássico continuou com clima quente. Nesse período a Pangeia dividiu-se em Laurásia ao norte e Gonduana ao sul, gerando um canal marinho, o Mar de Tétis, que parece ter sido ambiente para muitas espécies da fauna marinha tropical.

Os oceanos, inclusive o Atlântico, sofreram muitas transgressões: as águas, mais altas, avançavam sobre as terras, mais baixas, formando muitas áreas aquáticas rasas. Aos poucos o clima foi esfriando. Ao final do período Cretáceo, nova extinção em massa, com perda de cerca de 50% das espécies, inclusive muitas formas de dinossauros todos os amonóides. O Cenozoico, que começou há 66 Ma, continuou com clima mais frio por cerca de 10 milhões de anos. As correntes marinhas que se formaram quando a Antártida se separou da América do Sul resultou no seu clima gelado atual. Há 56 Ma os gases do efeito estufa aqueceram a atmosfera e os oceanos do planeta e várias linhagens de animais voltaram a aumentar, como os recifes de corais atuais. Agora, discute-se sobre o rápido declínio e extinção de muitas formas de vida causada pelo intenso crescimento das populações humanas e suas atividades econômicas em diversos pontos da Terra.

Como identificar as relações de parentesco entre os seres vivos?

Por Rosana Souza-Lima

Você já deve se perguntou por que alguns biólogos se preocupam tanto em catalogar as diversas espécies de seres vivos do planeta? Por que será que é importante saber em que grupo uma determinada espécie se encaixa? A área de trabalho que lida com essas questões é chamada de “Sistemática”, justamente pela preocupação em sistematizar (=organizar) nossos conhecimentos sobre os seres vivos. A sistemática, porém, vai muito além de apenas conhecer ou listar as espécies conhecidas. Vamos conversar sobre isso!

Imagine que queiramos identificar, por exemplo, os nichos alimentares que podem ser encontrados em determinada área, ou quais as relações ecológicas entre dois ou mais seres vivos de um dado lugar ou até mesmo comparar as proteínas que ocorrem em um determinado grupo de espécies. Bom: a primeira coisa que precisamos descobrir é de que espécies estamos falando, não é?

Nossas tentativas de reconhecer espécies e os modos de agrupá-las são muito, muito antigas: começaram cerca de 350 anos antes da Era Cristã, com os trabalhos do filósofo Aristóteles. A partir daí alternativas se sucederam, sendo mais ou menos aceitas pela comunidade científica. Em 1950 o entomólogo alemão Willi Hennig apresentou uma proposta metodológica que ganhou espaço ao longo dos anos: a metodologia cladista. Como funciona esse método?

Para que possamos avaliar os caracteres do ponto de vista evolutivo devemos, de início, formular uma primeira hipótese: serão esses caracteres homólogos ou homoplásicos? Homólogos são caracteres que possuem a mesma origem evolutiva, o que indica, portanto, parentesco entre os grupos comparados. As homoplasias são características muito parecidas entre si, mas que não têm uma mesma origem evolutiva. Ou seja: os caracteres ficaram parecidos por processos que os modelaram em resposta a alguma pressão ambiental. Vamos examinar um exemplo: à primeira vista, as nadadeiras de peixes e baleias são muito parecidas entre si. Entretanto, uma simples radiografia mostra que são formadas por estruturas muito diferentes: a semelhança é apenas externa, causada pelo fato de ser mais fácil se locomover no ambiente aquático possuindo uma estrutura que empurre a água. Além da aparente semelhança entre as estruturas comparadas, a posição anatômica em que essas estruturas se situam pode dar uma pista sobre sua provável homologia. E se for possível estudar o desenvolvimento embrionário dos organismos em questão, melhor ainda, pois os organismos mais relacionados entre si são muito parecidos durante o início do seu desenvolvimento. Quanto mais evidências analisamos, mais confirmamos a nossa hipótese sobre “aquele” ser um caráter que nos ajudará a identificar o parentesco entre os grupos estudados.

Uma vez definidas as homologias, chegamos ao ponto principal: selecionar quais delas são importantes na indicação do relacionamento entre as linhagens. Essa avaliação é o “pulo do gato” nessa metodologia! Como fazemos isso? Uma das possibilidades é comparar o grupo que estamos estudando (que agora chamaremos de grupo interno) com algum outro grupo que seja parecido com ele (grupo externo). O fato de serem parecidos facilitará na hora de compararmos as estruturas de ambos, porque nem sempre é fácil entendermos se se trata da mesma coisa. A regra é simples: se a característica examinada se apresentar da mesma forma em ambos os grupos, ela é considerada uma plesiomorfia: significa que é um caráter que já estava presente no ancestral de todos, e não representa uma novidade evolutiva para os grupos que estão sendo avaliados. Já se um dado caráter for diferente em um, alguns ou em todos os membros do grupo interno quando comparados aos membros do grupo externo, o caráter é considerado uma novidade evolutiva ou, em “biologuês”, uma apomorfia. Essa avaliação é a “polarização de caracteres”: a partir dessas deduções construiremos um quadro (=matriz) onde as plesiomorfias serão codificadas com zero, e as apomorfias codificadas com um; zero e um são os estados do caráter. Apenas as apomorfias, portanto, indicam parentesco entre os membros do grupo interno, que é o nosso grupo de interesse; o grupo externo só é utilizado para nos permitir formular hipóteses sobre a natureza dos caracteres que estamos observando. Por exemplo, vamos construir uma matriz a partir da comparação dos peixinhos exibidos na Figura 1: um desses taxa representa o grupo externo, e os 3 taxa seguintes representam espécies distintas (“Táxon” é uma palavra de origem latina que significa qualquer unidade taxonômica: pode ser usada para designar espécie, família, ordem, tribo… qualquer categoria! Seu plural é “taxa”).

Figura 1: Espécies de peixes que serão usadas para explicar ideia principal da metodologia cladista. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

O primeiro passo será levantarmos características a serem examinadas por comparação com o grupo externo. Ex.:

Tabela 1: Dados selecionados a partir de exame de espécies de peixes em estudo. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

A partir das polarizações que estamos propondo, construímos nossa matriz. Nessa matriz nem colocamos uma coluna para o grupo externo, porque como regra da metodologia já sabemos que todos os caracteres que ele possui são polarizados como plesiomorfias. Perceba que não adianta, portanto, computarmos as características que permanecem iguais às que ocorrem no grupo externo: essas características, como formato do corpo e formato do olho, são plesiomorfias que ocorrem em todos os 4 grupos e, portanto, não indicam parentesco. Um caráter plesiomórfico que une vários grupos é chamado de simplesiomorfia (sin = ‘junto’), e não tem valor informativo porque interpreta-se que já ocorria no ancestral dos grupos externo e interno. As novidades evolutivas, ou apomorfias, quando unem taxa são chamadas de sinapomorfias. Quantas sinapomorfias estão listadas na tabela abaixo?

Tabela 2: Matriz baseada nos caracteres listados na Tabela 2, baseados nos ‘animais’ exibidos na Figura 1. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

De posse da nossa matriz, vamos construir uma representação gráfica do processo evolutivo dessa linhagem que é chamado de cladograma. O cladograma começa mostrando uma linha do tempo, onde aos poucos vamos incluindo os fatos da história que estamos contando. Podemos começar pelos fatos mais abrangentes, que reúnem um maior grupo de taxa, para os menos abrangentes, que atinge apenas um táxon. Por exemplo: os caracteres 1, 2 e 3 ocorrem em todas as três espécies. Então, a história que contam começa assim:

Cladograma da história evolutiva do grupo estudado.
Figura 2: Primeiro passo na elaboração de um cladograma que exiba a história evolutiva do grupo estudado. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

O que significa a história contada na Figura 2? Que em determinado momento, ou em 3 momentos distintos, as alterações genéticas que se acumulavam numa dada linhagem resultaram no surgimento de 3 caracteres diferentes dos que já existiam. Nesse momento não conseguimos distinguir os indivíduos A, B e C entre si, porque todos os 3 tinham as 3 características novas. Essas características novas, portanto, são sinapomorfias que unem A, B e C. Sendo unidos por sinapomorfias, podemos dizer que o grupo ABC é monofilético: possui apenas uma (=mono) origem (=filético); o ancestral das linhagens ABC é o mesmo. Mas o que aconteceu depois? Como foi a diferenciação seguinte?

Figura 3: Passos seguintes na elaboração de um cladograma: aos poucos, acrescentamos novos caracteres, delineando os agrupamentos por eles definidos. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

Os caracteres 4, 5 e 9 nos fornecem a próxima pista: B e C formam um segundo grupo monofilético (Figura 3). O compartilhamento desses três caracteres mostra que B e C são mais próximos entre si do que do A. Podemos perceber, ainda, a plasticidade dos caracteres: enquanto os caracteres 1, 2 e 3 eram uma sinapomorfia que reúne A, B e C, eles podem ser encarados como uma simplesiomorfia para B e C. Ou seja: eles não servem mais para agrupar B e C, porque o surgimento de 1, 2 e 3 ficou para trás, para um outro momento dessa história. Foi necessário o surgimento de novas apomorfias, 4, 5 e 9, para que percebêssemos que B e C formam um grupo monofilético.

Figura 4: Cladograma incluindo todos os caracteres mencionados na matriz produzida pela análise dos exemplares (Figura 3). Os caracteres em cores diferentes da azul são autapomorfias de cada táxon terminal A, B ou C. Para mais explicações, veja o texto. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

Para que servem os caracteres escritos em cores diferentes do azul na Figura 4? Esses caracteres que são exclusivos de um táxon, e que não unem dois grupos, são chamados de autapomorfias. Embora não sejam úteis, nesse momento das nossas análises, para esclarecer as relações de parentesco entre ABC, servem para diagnosticar cada um desses taxa. No campo, por exemplo, se encontrarmos um peixinho desse tipo com manchas amarelas em formato de nuvens, já saberemos que se trata de um exemplar da espécie A. A presença dos caracteres autapomórficos nos mostra, também, que a todo momento estão surgindo modificações nas características de uma linhagem. Essas modificações são causadas por influência ambiental, ao longo do tempo, na carga genética dos organismos, provocando alterações que aos poucos se acumulam. Essa diferenciação genética ao longo do tempo se chama anagênese, e cria as condições gênicas para que aos poucos as espécies se diferenciem. Já falamos sobre anagênese e cladogênese na publicação sobre “Fósseis e a evolução dos seres vivos”. Dê mais uma olhada lá para relembrar!

Nem sempre os caracteres apomórficos apresentam-se em apenas um estado: você pode registrar todas as variações que vê em uma determinada estrutura. Já está implícito na metodologia que a ordem em que alguém os numera não necessariamente é a ordem em que apareceram na natureza. Pode inclusive ficar comprovado que apareceram em completa desordem. Veja um exemplo na Figura 5! No nosso grupo hipotético de peixes também temos um caráter multiestado, o caráter número 4 (Tabela 2). Veja que nesse caso não precisamos de nenhuma hipótese de ordenação dos caracteres para que ele nos fornecesse uma informação de parentesco entre os grupos B e C (Figura 4).

Figura 5: Exemplo hipotético da sequencia de transformações pelas quais pode passar um determinado caráter. A) Usando os números com os quais os caracteres foram listados; B) Avaliando as diversas formas assumidas pela estrutura analisada que pode ser, por exemplo, um determinado segmento ósseo. Copyright: Rosana Souza-Lima, 2021.

De acordo com a composição dos grupos internos e externos podemos polarizar o caráter de um modo diferente. Assim, como praticamente tudo na Ciência, as classificações estão sujeitas a novos ajustes e refinamentos à medida que novos taxa e novos caracteres forem acrescentados. E a partir de estudos das relações de parentesco entre organismos também temos uma ideia que corroboram ou não propostas geológicas e geográficas de como a Terra foi se modificando ao longo desses milhões de anos em que a vida se transforma. É uma linha de trabalho fascinante!

A origem da vida

Por Wagner Souza-Lima

Misture hidrogênio, amônia, metano e vapor d’água. Submeta a mistura a descargas elétricas e destile o líquido obtido. Isso, que parece uma receita, foi uma experiência química realizada em 1952 pelos químicos Stanley Miller (1930-2007) e seu professor, Harold Urey (1893-1981). Baseada na hipótese do bioquímico russo Aleksandr Oparin (1894-1980) de que a atmosfera primitiva da Terra seria fortemente redutora, e constituída destes compostos, o experimento tentava reproduzir processos que teriam ocorrido na Terra durante as etapas iniciais de resfriamento logo após a sua formação. As descargas elétricas simulavam as frequentes tempestades com raios – o processo forneceria energia para que algumas moléculas da atmosfera se unissem, gerando moléculas maiores e mais complexas, que seriam as primeiras moléculas orgânicas do nosso planeta. Ao final do experimento, que ficou conhecido como de “Miller-Urey”, a análise da solução mostrou a presença de alguns aminoácidos que seriam precursores da origem da vida. Os aminoácidos inicialmente identificados foram a glicina, alanina e o ácido aspártico. Muito tempo depois, a análise dos líquidos destes experimentos, guardados em recipientes selados, mostraram a existência de mais de 20 aminoácidos, número superior àquele que ocorre naturalmente no código genético.

Stanley Miller em seu laboratório na University of California San Diego (1970)
Stanley Miller em seu laboratório na University of California San Diego (1970). Fonte: SIO Photographic Laboratory records. SAC 0044. Special Collections & Archives, UC San Diego [https://library.ucsd.edu/dc/object/bb5359436b].

Os processos hipotéticos que sugerem que o surgimento da vida ocorreu como um processo natural ocorrido por reações entre composto inorgânicos são agrupados na “ABIOGÊNESE”. Na verdade, existem várias hipóteses acerca do surgimento da vida na Terra. Estas hipóteses abrangem desde fontes extraterrestres – a hipótese da panspermia, através da qual a vida microscópica teria se desenvolvido fora da Terra e trazida para o planeta por meteoroides e outras partículas celestes, até modelos essencialmente abstratos, como o que sugere que as associações ao acaso de diversos compostos químicos competissem entre si, até que a mais viável conseguisse estabelecer funções essenciais de um sistema vivo primitivo. Mas até o momento, a hipótese da origem baseada nas ideias de Miller-Urey e outras derivadas e relacionadas, é ainda bastante plausível e aceita pela comunidade científica.

Evidências mais recentes sugerem que a composição da atmosfera primitiva da Terra seria ligeiramente diferente da avaliada no experimento, contudo experimentos prebióticos seguem produzindo compostos simples e outros complexos, o que valida o experimento.

Hoje sabemos que, para que haja a vida, alguns elementos químicos, denominados de “biogênicos”, são essenciais: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre. Além disso, é fundamental que as temperaturas que ocorriam no início da história do nosso planeta, mesmo que extremas, permitissem a existência de água no estado líquido.

Ambientes deste tipo são encontrados em sistemas hidrotermais ricos em ferro em águas ultra-profundas dos oceanos, associados às cadeias meso-oceânicas e denominados de “suspiros submarinos” (submarine vents). Estas feições constituem fontes termais onde foram descobertas ricas comunidades biológicas vivendo na mais completa escuridão, a profundidades superiores a 2500 m. Estas comunidades se alimentam de bactérias quimiolitoautotróficas, ou seja, de organismos que produzem substâncias nutritivas (trophos) a partir da energia liberada por reações químicas entre componentes inorgânicos, neste caso as rochas (litos) e os gases (chimios) liberados por estas estruturas, normalmente ricos em sulfetos de hidrogênio.

Exemplos de suspiros submarinos e das comunidades biológicas que ocorrem associadas a esses ambientes. Em A, chaminés de fumarolas brancas situadas na região do arco da Mariana, adjacente à fossa de mesmo nome, no Oceano Pacífico. Em B, tubos de poliquetas (um anelídeo) gigantes (Riftia pachyptila) que se desenvolvem em torno destes suspiros próximos às ilhas Galápagos. Em C, mexilhões com alguns pequenos caranguejos, camarões e gastrópodos, também da região do arco da Mariana. Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration, NOAA, EUA, domínio público.

A compreensão destas feições deu suporte à hipótese de que os primeiros seres vivos seriam autotróficos, ou seja, produziriam seu próprio alimento a partir da reação de substâncias orgânicas, como o gás carbônico, com a energia proveniente do ambiente, como se observa ainda hoje com alguns tipos de bactérias e com as plantas (p. ex., o processo de fotossíntese). Trata-se de uma hipótese muito provável, pois apenas com o progresso da vida sobre o planeta é que começou a haver moléculas orgânicas suficientes para sustentar uma maior quantidade e diversidade de seres vivos. Surgiriam então os organismos heterotróficos, que obteriam alimento a partir dessas moléculas orgânicas (heteros, diferente).

Diagrama esquemático dos processos físicos e químicos que ocorrem nas fontes hidrotermais submarinas (submarine vents). Estas fontes ocorrem nas cadeias que se originam nos limites das placas oceânicas, a grandes profundidades, de onde o magma ascende em direção ao fundo do mar sob a forma de lava e gases. A lava se solidifica rapidamente em contato com as águas frias, ao passo que os gases reagem com as rochas e com a água do mar, formando compostos químicos que ficam em solução e/ou se precipitam como minerais. Fonte: adaptado de National Oceanic and Atmospheric Administration, NOAA, EUA, domínio público.

Estudos recentes de algumas das rochas da Terra, com idade em torno de 3,2 bilhões de anos, mostraram um padrão de proporção de átomos leves e pesados de nitrogênio apenas conhecido quando oriundo das atividades realizadas por organismos unicelulares que sintetizam enzimas que permitem a fixação desse elemento. Outros estudos, efetuados em rochas com idades entre 3,8 e 4,3 bilhões de anos, provenientes da província de Québec, no Canadá, constataram a presença de filamentos tubulares microscópicos que foram interpretados como bactérias oceânicas que metabolizavam ferro em ambientes submarinos hidrotermais do início do Arqueano ou ainda mais antigos.

Tubos de hematita (A, B) e rosetas de carbonato (C, D) encontradas em rochas do início do Arqueano no Canadá. Estas feições foram interpretadas como fósseis de micro-organismos filamentosos e outros microfósseis gerados em ambientes de suspiros submarinos semelhantes aos atuais. Fonte: Dodd et al., 2017 – © 2017 Macmillan Publishers Limited, part of Springer Nature.

Ambientes geotermais superficiais modernos também reproduzem, de certo modo, condições semelhantes às que podem ter existido no começo da história do nosso planeta. Nestes ambientes, ocorrem fontes com altas temperaturas, ricas em compostos minerais em solução, e gases em abundância. E, onde menos se esperaria vida, se encontram bioconstruções associadas à atividade de cianobactérias e/ou outras bactérias hipertermófilas (organismos que suportam ambientes com temperaturas superiores a 60°C).

Campo geotermal moderno exibindo uma série de suspiros semelhantes, em forma, àqueles encontrados nas grandes profundidades das cadeias oceânicas submarinas. Em A, um aspecto geral da área; em B, um detalhe de uma dessas construções, e em C, uma curiosa construção microbial que se desenvolve nas áreas em que a água, sob alta temperatura, se acumula. Campo geotermal “El Tatio”, deserto de Atacama, Chile. Fonte: Wagner Souza-Lima, 2021 (CC BY-NC 4.0).

Quatro grupos principais de compostos químicos regem as funções vitais: os lipídios (que constituem, p. ex., a membrana celular), os carboidratos (uma fonte de energia, representada, p. ex., pelos açúcares), os aminoácidos (fundamentais na síntese proteica) e os ácidos nucléicos (os “famosos” DNA e RNA). Assim, independente da hipótese acerca do surgimento da vida, quaisquer teorias devem explicar a origem e interação entre estas moléculas.

Porém certamente a transição de formas não viventes para os seres vivos não ocorreu como um evento único, sendo um processo evolutivo de complexidade crescente ao longo de todo o tempo geológico. Destes processos, talvez um dos mais importantes foi o do desenvolvimento da membrana plasmática, uma delicada película que envolve os componentes internos às células, mantendo condições físico-químicas diferenciadas e adequadas aos processos químicos fundamentais à existência da vida.

Estes e outros eventos, quando, como e onde ocorreram, é o que veremos no tópico “Os principais eventos na história da vida na Terra”.

Orville Adelbert Derby

Por Wagner Souza-Lima

Orville Adelbert Derby, mais conhecido na geologia brasileira como “Derby”, nasceu em 23 de Julho de 1851 no pequeno povoado de Kellogsville, na zona rural da cidade de Niles, no Estado de Nova York, Estados Unidos.

Ingressou aos 17 anos, em 1869, na Cornell University, em Ithaca, onde logo chamou a atenção de Charles Frederic Hartt, professor naquela instituição. Hartt, que encantara-se pela Geologia do Brasil desde que havia participado da “Expedição Thayer” (1855-1856), organizada por Louis Agassiz, percebeu em Derby um grande potencial, e como preparava-se para sua primeira expedição independente ao Brasil, convidou-o para participar da “Expedição Morgan”. Esse fato influenciaria definitivamente a carreira e vida de Derby.

Partiram para o Brasil em 23 de Junho de 1870, desembarcando em Belém do Pará. Daí exploraram o vale do rio Amazonas, quando foram descobertas a rica fauna carbonífera do rio Tapajós e os fósseis devonianos de Monte Alegre e da serra do Ererê. Além de Hartt e Derby, participaram da expedição o Prof. Albert Nelson Prentiss (1836–1896), botânico, e mais 12 estudantes da Cornell University.

Derby, aos 19 anos, com Charles Frederick Hartt, durante a expedição Morgan (acervo de Derby, no Museu de Ciências da Terra, Rio de Janeiro).

O sucesso da primeira expedição Morgan propiciou uma segunda expedição, também financiada principalmente pelo empresário e político Edwin Barber Morgan (1806–1881). Na segunda Expedição Morgan, realizada entre Julho e Dezembro de 1871, Hartt e Derby, este com 20 anos, retornaram ao vale do Amazonas , e examinaram também diversos pontos entre a costa do Pará e de Pernambuco, estudando pela primeira vez os fósseis cretáceos de Pernambuco.

Regressando para os EUA em Janeiro de 1872, Derby graduou-se em Geologia em 1873 e obteve o título de “Master of Science” em 1874, com sua tese “On the Carboniferous Brachiopoda of Itaituba, Rio Tapajos, Prov. of Pará, Brazil“, orientada por Hartt. Em 1874, com a partida de Hartt para o Brasil, o substituiu como instrutor de Geologia na Cornell University.

Devido ao prestígio adquirido em suas pesquisas no Brasil, Hartt foi convidado ao Brasil em 1874 a fim de apresentar sua proposta de criação de um serviço geológico para o Império. Acompanhou-o seu assistente e aluno John Casper Branner (1850-1922). Em meados de 1875 conseguiu, finalmente, a aprovação de sua proposta, criando-se a “Commissão Geologica do Imperio do Brasil”, assumindo a sua direção. Assim, chamou para participar da comissão, quatro antigos alunos dentre os quais Derby e Richard Rathbun (1852-1918). Integrariam também a comissão, Elias Fausto Pacheco Jordão (o primeiro brasileiro a estudar em Cornell), Francisco José de Freitas, John Casper Branner, Luther Wagoner, Franck G. Carpenter, Herbert Huntington Smith (1851–1919), e o fotógrafo Marc Ferrez (1843–1923).

Comissão Geológica do Império (1875) – ao centro, sentados, Charles Frederick Hartt, Derby e Marc Ferrez (acervo de Derby, no Museu de Ciências da Terra, Rio de Janeiro).

Em Dezembro de 1875, Derby chegou ao Brasil, onde viveria até o fim da sua vida. Seus primeiros estudos nesta nova fase foram dedicados ao Cretáceo da Bahia e Sergipe, e também à geologia do rio São Francisco. Posteriormente dedicou-se a estudos no Pará, Paraná e Amazonas.

Além do amplo conhecimento adquirido acerca da geologia do Brasil, pelos trabalhos da comissão, um riquíssimo acervo geológico, paleontológico, zoológico e arqueológico foi coletado. Por motivos mais políticos do que econômicos, contudo, o destino da comissão foi selado pelo ministro da Agricultura (órgão à qual estava vinculada), o conselheiro João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu. Apesar de todo o êxito dos trabalhos realizados pela comissão e da vasta coleção obtida, ela foi suspensa temporariamente em 1877 e extinta em 1878, com a morte de Hartt. A morte de Hartt causou um grande impacto em Derby, que lhe fez companhia até os seus últimos minutos de vida.

Em 1876, com a reorganização do Museu Nacional, em 1876, Hartt havia se tornado diretor do departamento de Geologia, mas ficou pouco tempo no cargo devido aos afazeres que tinha na comissão. Em 1877, com a suspensão temporária da comissão, Derby, com 26 anos, começou a atuar como voluntário no museu. Com a extinção da comissão no ano seguinte, não mediu esforços em resgatar o enorme acervo e colocá-lo em salvaguarda no Museu Nacional, que à época funcionava no Campo da Aclamação (hoje Campo de Santana). A coleção de fósseis obtidos das duas expedições Morgan e da extinta comissão era tão expressiva que compunha 70% da coleção paleontológica daquele museu até o fatídico incêndio de 2018. Em 1879 foi efetivado como diretor da seção de Geologia, cargo em que permaneceu até 1886, quando iniciou sua colaboração na organização dos trabalhos dos levantamentos topográficos e geológicos de São Paulo.

No Museu Nacional publicou, à exceção de sua tese de mestrado, os primeiros trabalhos sobre a geologia do Brasil, no recém-criado “Archivos do Museu Nacional”. Sua produção científica foi imensa! Entre os anos de 1879 e 1890 publicou 42 trabalhos sobre a geologia, mineralogia e paleontologia do Brasil. Derby foi um dos principais pesquisadores envolvidos para o translado do enorme meteorito Bendegó desde o sertão da Bahia até o Museu Nacional, em 1888. Muitos dos aparelhos utilizados por Derby nas suas pesquisas (p. ex., três microscópios e um espectrômetro), comprados com seus próprios recursos, constavam no acervo do Museu Nacional até o incêndio de 2018.

Derby colaborou formalmente com o Museu Nacional até 1890, quando foi exonerado ao entrar em vigor um regulamento que impedia o acúmulo de cargos, já que ele chefiava a Comissão Geográfica e Geológica da Província de São Paulo.

Em todo o período que viveu no Brasil, entre 1875 e 1915, Derby apenas afastou-se do Brasil em três ocasiões, duas delas por motivos dos seus trabalhos no Museu Nacional, e uma pela Comissão de São Paulo.

Derby residiu em São Paulo a partir de 1886, e permaneceu no comando da Comissão Geográfica e Geológica da Província de São Paulo até o início de 1905. Neste ano desligou-se da comissão devido a uma série de desentendimentos que já vinham acontecendo desde 1900, através de críticas à sua metodologia criteriosa, redução de verbas e redução de salários. Assim como acontecera com Hartt, em relação à Comissão do Império, Derby sucumbia por motivos políticos.

Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo – De pé, atrás, estão Antônio Avé Lallemant, Luiz Felipe Gonzaga de Campos, Eugen Hussak, Axel Frick, Antônio Lacerda e Alberto Löfgren. Sentados, Francisco de Paula Oliveira, Orville Adelbert Derby, Theodoro Fernandes Sampaio e João Frederico Washington Aguiar. Fotografia publicada no Boletim do Instituto Geográfico e Geológico.

Tão logo saiu da Comissão de São Paulo, Derby foi convidado por Miguel Calmon du Pin e Almeida (1879-1935), Secretário da Agricultura do Estado da Bahia, para reorganizar, com plenos poderes, o “Serviço de Terras e Minas do Estado da Bahia”. Derby permaneceu no cargo por dois anos, quando foi novamente convidado por Miguel Calmon, agora Ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas do governo de Affonso Penna, para instalar o “Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil”. Este órgão foi criado em 10 de Janeiro de 1907, tendo Derby como seu primeiro diretor.

Mesmo envolvido ao longo de sua vida profissional com atividades administrativas e, muitas vezes, burocráticas, Derby teve uma imensa produção científica, totalizando 175 publicações versando sobre a geologia em geral, mineralogia, geologia econômica, geografia física, cartografia, paleontologia, meteorologia e outros temas, dos quais 125 foram voltados à Geologia do Brasil. Considerado pelos seus colaboradores como uma pessoa extremamente polida, educada e respeitosa, nunca se deixou levar a ações grosseiras, mesmo tendo sido alvo de várias críticas por adversários invejosos, tanto no meio político como científico.

Foi entre 1912 e 1915 que a paleontóloga norte-americana Carlotta Joaquina Maury (1874-1938) colaborou, por convite de Derby, com o Serviço Geológico do Brasil, deixando importantes contribuições à Paleontologia do Brasil, em especial à de Sergipe. Além dela, vários respeitados pesquisadores estrangeiros estiveram envolvidos na pesquisa científica do país, todos a convite de Derby, como John Casper Branner, Roderic Crandall, Franz Eugen Hussak, Horace Elbert Williams e Milton Underdown.

Derby dedicou a maior parte de sua vida ao Brasil, onde viveu por 40 dos seus 64 anos de vida. Em Abril de 1915, solicitou finalmente sua naturalização brasileira, oficializada em Julho do mesmo ano.

Desde 1910 o “Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil”, onde atuara por mais de oito anos, passava por momentos difíceis, com cortes de verbas e, como conseqüência, das suas atividades. Não se sabe exatamente quais os verdadeiros motivos que levaram Derby, em 27 de Novembro de 1915, a cometer suicídio, com um tiro de revólver à cabeça. Morava há nove anos no “Hotel dos Estrangeiros”, na Praça José de Alencar, no Catete, Rio de Janeiro. Nada deixou de pista, apenas uma carta iniciada para João Pandiá Calógeras, ex-ministro da Agricultura, Indústria e Comércio, onde apenas se lia “My dear Dr. Calogeras…“. Sabe-se apenas que Calógeras, quando ministro, no início de 1915, reduzira de forma ainda mais drástica o orçamento do Serviço Geológico, mudando também as diretrizes estabelecidas por Derby.

Derby sempre teve uma vida solitária, sem família no Brasil, longe dos seus laços originais americanos. Nunca se casou. Morou sempre em quartos de hotel. Teve fiéis amigos, que foram seus colaboradores no Museu Nacional ou pelos serviços geológicos por onde passou. De certo modo, sua vida foi dedicada exclusivamente a destrinchar a geologia do Brasil. Sua dedicação foi fundamental ao avanço do conhecimento geológico do Brasil, tornando-o um dos mais importantes geólogos que o país já teve.

Para saber mais:

  • Tosatto, P. 1998. Imagens do Brasil no tempo de Derby. DNPM, Rio de Janeiro, 128 pp.
  • Tosatto, P. 2001. Orville A. Derby – “O pai da Geologia do Brasil”. CPRM, DNPM, Rio de Janeiro, 126 pp.
  • Mahl, M. L. 2012. Orville Adelbert Derby: Notas para o Estudo de sua Atuação Científico-Intelectual em São Paulo (1886-1905). Revista de História, São Paulo, 167: 295-320.
  • A Noite, 1915. Suicida-se o eminente scientista Orville Derby. 1413, p. 1.

Poções da Ribeira

Por Wagner Souza-Lima

POÇÕES DA RIBEIRA

Os Poções da Ribeira constituem uma feição geológico-geomorfológica localizada ao sul da cidade de Itabaiana, no Estado de Sergipe, a pouco mais de 50 km de Aracaju. Constitui um magnífico sítio natural exibindo uma drenagem superimposta formada pela passagem do rio das Traíras através do prolongamento sul da serra de Itabaiana. O leito do rio define um cânion mais suavizado na sua porção norte e profundamente ressaltado mais ao sul, onde, na sua porção mais exuberante, que constitui a saída do cânion, alcança cerca de 100 m de altura e 25 m de largura, na sua parte mais inferior.

Do ponto de vista geológico, o sítio está implantado em rochas metassedimentares do Grupo Miaba, de idade neo-proterozóica (eocriogeniana?; entre 800-850 Ma), envolvendo as formações Itabaiana (quartzitos) e Ribeirópolis (filitos e metargilitos). O sítio encontra-se na margem sul do “Domo de Itabaiana”, uma feição estrutural do tipo braquianticlinal, originada provavelmente ainda no Neo-Criogeniano, antes da deformação regional de toda a faixa dobrada, que ocorreu no final do Proterozóico (no ciclo denominado “Brasiliano”), cujo núcleo é composto principalmente por gnaisses e migmatitos, em relevo negativo, circundado pelas cristas metassedimentares soerguidas nas diversas fases de deformação subsequentes.

Mapa geológico do Domo de Itabaiana (adaptado do “Mapa geológico do Estado de Sergipe”, CPRM/CODISE, 1997). Os “Poções da Ribeira” localizam-se na Serra Comprida, que é o prolongamento sul da Serra de Itabaiana.

O rio das Traíras, responsável pelo delineamento do sítio, faz parte da bacia hidrográfica do Vaza-Barris. Nasce nas proximidades da cidade de Macambira, em Sergipe, nas vertentes orientais da Serra da Miaba, atravessando o setor ocidental do domo, composto por gnaisses e migmatitos do embasamento neo-arqueano/paleoproterozóico, cujo relevo é relativamente aplainado. A pouco mais de 3 km antes do sítio em questão (ao norte), o rio das Traíras encontra-se represado pela barragem da Ribeira, uma estrutura de terra com 26 m de altura e 500 m de comprimento. Isto faz com que o rio, no trecho dos Poções, entre a barragem e o rio Vaza-Barris, tenha normalmente pouca água, que é mais abundante apenas no período das chuvas ou por eventual transbordamento da barragem. Após o sítio, o rio das Traíras encontra-se com o rio Vaza-Barris em sua margem esquerda, depois de percorrer pouco mais de 3 km.

Vista dos Poções da Ribeira no trecho do contato entre as formações Itabaiana e Ribeirópolis.

O setor mais visitado do sítio é o da desembocadura do cânion. Nele, o rio das Traíras cortou os quartzitos da Formação Itabaiana, os quais, nesta área, apresentam acentuado mergulho (em torno de 45°). O rio ziguezagueia pelas rochas formando poços de profundidades variadas (informações não verificadas indicariam que o poço mais externo, ainda nos quartzitos, apresenta profundidade superior a 12 m) até formar um pequeno lago, de fundo arenoso, instalado sobre rochas da Formação Ribeirópolis.

Percorrer o cânion não é muito fácil, principalmente devido à sua restrita entrada, ao elevado ângulo de mergulho das camadas no trecho inicial e ao grande poço nela existente. Porém, com os devidos cuidados, é uma caminhada prazerosa.

A vegetação predominante é do tipo savana gramíneo-lenhosa, com florestas-de-galeria localizadas em alguns trechos internos ao cânion e, em maior extensão, após a desembocadura do mesmo.

Como chegar

Chegar até o local não é difícil, mesmo em carros não tracionados. O acesso se dá pela BR-235 até o povoado de Rio das Pedras. Dois quilômetros adiante, toma-se o acesso à esquerda (SE-102) para o povoado da Ribeira. Todo o trajeto é facilmente roteável.

Coordenadas do sítio: 10°49’50″S; 37°27’00″O